Blog da Produttare
Autores:
Rodrigo Pinto Leis (UFRGS) rodrigo@produttare.com.br
José Antonio Valle Antunes Júnior (UNISINOS) junico@produttare.com.br
Marcelo Klippel (UNISINOS) marcelo@klippel.com.br
Resumo
Este artigo aponta para a necessidade do desenvolvimento de indicadores de desempenho globais, integrados e sistêmicos por parte das empresas focadas na gestão de operações, através de múltiplos estudos de caso em Oficinas Mecânicas de Concessionárias de Automóveis no Rio Grande do Sul. Tal fato torna-se relevante, pois verifica-se em diversos casos, incluindo os estudados, a tendência dos sistemas de indicadores serem conflitantes, levando a tomada de decisões inapropriadas, maximizando resultados locais e não globais. Tendo como base à literatura da Teoria das Restrições, verificou-se uma lacuna no que tange a existência de um sistema adequado para o desenvolvimento de indicadores alinhados estrategicamente aos objetivos da empresa como um todo. O objetivo deste artigo é, portanto, apresentar de forma sistemática, o desenvolvimento do sistema de indicadores de desempenho aplicado à Oficinas Mecânicas de Concessionárias de Automóveis que pode nortear as ações dos colaboradores envolvidos nos processos operac
ionais de forma a obterem resultados melhores do ponto de vista global das organizações.
Palavras-chave: indicadores; concessionárias; oficinas mecânicas; Teoria das Restrições
1. Introdução
A última década de 90 foi marcada por grandes transformações no cenário político, social e econômico. Tais alterações tendem, também, a se refletirem nos interesses dos pesquisadores em estudar assuntos que, inseridos neste contexto amplo, tendem a tornar-se centrais como, por exemplo, descontinuidade, turbulência, mudança, crise, competitividade internacional, etc. Dois aspectos foram fundamentais e afetaram diretamente a maneira como as empresas competem, forçando-as a modificarem seus processos, sistemas e até mesmo seus negócios. O primeiro aspecto refere-se a passagem da era industrial para a era da informação, conseqüência direta das evoluções tecnológicas e dos sistemas de informação. O segundo aspecto é a chamada ‘globalização’, transformando mercados regionais e cativos em áreas de atuação em nível internacional, acirrando desta forma a concorrência e exigindo esforços diferenciados para as empresas continuarem competindo. Como as empresas contemporâneas atuam em mercados caracterizados, na sua grande maioria, por margens de lucro cada vez menores, torna-se evidente a necessidade de um sistema de indicadores que capacite estas empresas a avaliarem seu desempenho de maneira global e com maior acurácia, objetivando o atingimento das metas e estratégias estabelecidas. Os indicadores de desempenho de um sistema produtivo possuem uma importância estratégica fundamental para o sucesso do negócio. Isto decorre do fato de que o comportamento e a atitude dos colaboradores são induzidos pela forma como são avaliados (GIANESI & CORRÊA, 1996).
Dentro deste contexto empresarial, podemos citar as concessionárias de automóveis brasileiras, segmento este que carece de maior atenção por parte dos pesquisadores em virtude da pouca ou quase inexistente quantidade de estudos e trabalhos sobre estas empresas que compõem uma indústria também importante para o desenvolvimento econômico do país – a indústria automotiva.
2. O ambiente de pesquisa
Até o início da década de 90, o segmento de concessionárias autorizadas de automóveis constituía-se em um oligopólio, envolvendo quatro grandes fabricantes internacionais instalados no País - Ford, Volkswagen, Fiat e General Motors - que detinham os direitos de conceder a concessão da marca. Além disto, a demanda global era, em grandes linhas, maior que a oferta, sem falar da existência de barreiras tanto para a instalação de novas fábricas de outras marcas quanto para a importação de veículos. Neste ambiente as concessionárias dispunham de instrumentos de proteção próprios e usufruíam de lucros elevados principalmente com a venda de veículos novos. Em função deste fato, geralmente deixavam os demais negócios da empresa em segundo plano (RIBEIRO, 2000).
Esta política de fechamento da economia nacional aos mercados externos estendeu-se até o início da década de 90, quando então, a reabertura de nosso mercado, possibilitou uma corrida por investimentos vultosos em nível internacional em vários segmentos da nossa economia. Entre os setores que mais investimentos fizeram durante este período no nosso país, destaca-se o setor automotivo. As concessionárias autorizadas de automóveis são atualmente os principais meios de distribuição dos veículos produzidos pelos fabricantes de veículos instalados no país. Portanto, estudar este setor é importante para que seja possível entender as principais relações existentes entre os consumidores, as concessionárias de automóveis, os fabricantes e os fornecedores destes. Também é importante estudar a problemática das concessionárias tendo em vista a escassez de material literário disponível sobre o mesmo em revistas, livros, artigos técnicos e publicações em geral. O segmento apresentou na última década um crescimento proporcional ao número de fabricantes de automóveis que se instalaram no país neste mesmo período. Atualmente, as concessionárias passam por um período de estagnação no seu crescimento, relacionado com as questões macroeconômicas mundiais, que afetam toda a indústria automobilística. Diante de tais desafios, estas mesmas empresas tentam através da aplicação de diversos métodos e ferramentas de gestão, tornar seus negócios ainda lucrativos. Isto porque, nos últimos anos, as empresas deste segmento têm apresentado quedas contínuas nos seus resultados econômico-financeiros. As concessionárias autorizadas trabalham com quatro tipos de negócios: venda de veículos novos, venda de veículos usados, venda de peças e acessórios e serviços de assistência técnica (divididos em serviços de oficina mecânica e serviços de funilaria e pintura).
Neste novo contexto, com concorrência maior em todos os níveis (preço, prazo, qualidade, flexibilidade, etc.), perfil do cliente modificado (informado, exigente e com poder de decisão) e os lucros das vendas de carros e peças/acessórios já não são mais capazes de cobrir todos os prejuízos, se faz necessária uma reavaliação por parte dos gestores com relação ao modelo estratégico empresarial vigente. Logo, as áreas de assistência técnica das concessionárias de automóveis aumentam de importância para o sucesso do negócio como um todo a partir do momento em que os fabricantes de automóveis começam a estreitar as relações com os clientes finais em relação à venda de automóveis e peças/acessórios. Entre os diversos aspectos a serem revistos por parte dos agentes de mudança que estão ligados as áreas de assistência técnica destas organizações, destacam-se os sistemas de indicadores de desempenho, que são de fundamental importância para o sucesso das mesmas, pois são responsáveis por nortear as ações dos colaboradores além de auxiliarem na tomada de decisão em todos os níveis no sentido de atingir as metas e estratégias estabelecidas.
Assim, este artigo tem por objetivo analisar criticamente os sistemas de indicadores de desempenho utilizados por quatro concessionárias de automóveis autorizadas nas suas áreas de assistência técnica, mais especificamente nos serviços de oficina mecânica – os serviços de funilaria e pintura são excluídos desta pesquisa porque são pouco relevantes no impacto financeiro da área de assistência técnica, representando no geral, menos de 10% do lucro líquido destas áreas de negócio - baseada em uma pesquisa desenvolvida nestas organizações, que possuem suas matrizes em Porto Alegre e algumas filiais no interior do Rio Grande do Sul (Tabela 1) e verificar quais os impactos gerados quanto à avaliação de desempenho e tomada de decisão por parte de seus colaboradores à luz de uma abordagem teórica – a Teoria das Restrições, que advogada a favor de um sistema de indicadores capaz de proporcionar uma tomada de decisão melhor adequada às necessidades globais das organizações.
3. Método e instrumentos de pesquisa
No presente trabalho foi utilizado o Estudo de Múltiplos Casos, pois se podem estudar em profundidade poucos casos, de forma a permitir o conhecimento amplo e detalhado destes mesmos. Além disto, o Estudo de Múltiplos Casos é considerado mais convincente e robusto do que o Estudo de Caso Único, pois se pode ampliar o horizonte de análise, tornando mais fácil à generalização analítica do estudo (YIN, 2001). Os critérios para a escolha dos quatro casos, apresentados na Tabela 1, foram os seguintes: i) a posição da marca do fabricante em número de veículos novos vendidos em todo o Brasil no ano de 2001; ii) a utilização de uma marca que não às tradicionais do mercado brasileiro, neste caso uma concessionária Toyota; iii) a liderança de mercado destas empresas em suas regiões e; iv) por possuírem destaque nacional no segmento de concessionárias de automóveis.
Os instrumentos de pesquisa utilizados foram: a entrevista em profundidade; a análise de documentos e as reuniões. A técnica de entrevista foi empregada no início da pesquisa, com o objetivo de coletar diversas questões relativas a cada uma das concessionárias. O tipo de entrevista utilizada foi a semi-estruturada, pois se criou um roteiro para servir de guia para o pesquisador na condução da pesquisa. Este roteiro é constituído de questões abertas, criadas com base na teoria, para conduzir o entrevistado e não limitar ou predeterminar suas respostas. Visando facilitar a entrevista bem como a interpretação das respostas e os seus registros, utilizou-se com a autorização dos entrevistados um gravador. Posteriormente, estas gravações foram transcritas ipsis literis para facilitar a análise e tentar realizar algumas comparações. Também foi elaborada uma lista contendo os dados necessários para a pesquisa. Esta lista tem por objetivo coletar informações com base em documentos e relatórios particulares das empresas, pois contém dados confidenciais de cada uma delas.
4. Referencial Teórico
A Teoria das Restrições, baseada na afirmação de Goldratt (1996) de que a soma dos ótimos locais não é igual ao ótimo global, possui três questionamentos conforme aponta Rodrigues (1990): (a) qual é o ótimo global de uma empresa e quem determina esta meta? (b) como saber se a meta está sendo alcançada? (c) como definir ações locais visando o alcance da meta? Para a Teoria das Restrições, a meta da empresa deve ser ganhar dinheiro hoje e no futuro, além de procurar satisfazer os empregados e os clientes hoje e no futuro, acrescenta Goldratt (1996). As medidas são o resultado direto da meta escolhida, afirma Goldratt (1994), por isto possui uma expressão que resume este sentimento: "Diga-me como me medirás e dir-te-ei como me comportarei". Para alcançar a meta da empresa, Goldratt propõe três Indicadores Globais de Desempenho, que permitem medir o alcance da meta: i) Lucro Líquido – LL; ii) Retorno Sobre o Investimento – RSI; iii) Fluxo de Caixa – C.
As medidas que se procuram para realizar a análise são aquelas com as quais se pode verificar o impacto de uma decisão local no desempenho global. Normalmente verifica-se nas empresas que a tomada de decisão dos gerentes procura ações que solucionam efeitos negativos, não havendo uma preocupação por parte destes em entender as causas destes efeitos. Goldratt (1996) desenvolve os Indicadores Operacionais de Desempenho para poder atingir os Indicadores Globais de Desempenho, pois é necessário existir uma inter-relação entre os níveis operacionais e globais. Os Indicadores Operacionais de Desempenho são necessários, para saber se as ações gerenciais tomadas na empresa estão levando ao atingimento da meta. Estes são: a) Ganho (Throughput): é o índice pelo qual o sistema gera dinheiro através das vendas; b) Inventário (Inventory): é todo o dinheiro que o sistema investe na compra de coisas que podem ser vendidas no futuro: máquinas, prédios, material em processo e produtos acabados; c) Despesas Operacionais (Operating Expenses): é todo o dinheiro que o sistema gasta transformando o inventário em ganho. A escala de importância destas medidas é: Ganho (G), Inventário (I) e Despesas Operacionais (DO). Esta escala de importância caracteriza o que Goldratt (1996) denomina de ’Mundo dos Custos e Mundo dos Ganhos’. No primeiro, a ênfase é na eficiência local no qual a maximização do desempenho local é a prioridade e a meta é reduzir os custos dos produtos. Já no segundo, a prioridade é maximizar o ganho, o que significa usar da melhor maneira possível à restrição ou elevar a sua capacidade, buscando sempre produzir o mix de produtos que renda o maior ganho.
O objetivo da análise dos Indicadores Operacionais de Desempenho da TOC é poder avaliar o impacto das decisões locais não sobre uma das medidas, mas sobre a relação entre os três. De acordo com Goldratt (1996), podem-se interligar estas relações com as medidas globais de desempenho das empresas através das seguintes fórmulas: LL = G - DO; RSI = LL / Investimento. Goldratt (1996) indica a possibilidade do uso de outro par de medidas conhecidas, mas enfatiza que a utilização de um par elimina a possibilidade de utilização do outro, que são: Produtividade = G / DO; Giros = G / I. O Lucro Líquido cresce com o aumento do Ganho e com a diminuição das Despesas Operacionais. O Retorno Sobre o Investimento aumenta com o Ganho e com a diminuição das Despesas Operacionais. O Fluxo de Caixa é afetado positivamente pelo aumento do Ganho e negativamente pelo aumento do Inventário e da Despesa Operacional. O Inventário mantém uma relação direta com a Despesa Operacional (quanto maior o I maior tende a ser a DO) e inversa com o Ganho (quanto menor o I maior a habilidade da empresa em gerar G).
5. Descrição dos Casos
Inicia-se a descrição dos casos pela explicitação em relação à como são classificados os colaboradores que atuam nestas áreas, uma vez que as pessoas estão intrinsecamente ligadas aos indicadores de desempenho. Nos quatro casos estudados, verifica-se uma padronização quanto à forma de classificação e organização dos colaboradores que participam do processo produtivo das oficinas mecânicas. Atualmente estas empresas dividem seus colaboradores em Produtivos - aqueles que realmente participam dos reparos nos veículos (mecânicos, auxiliares mecânicos, eletricistas, montadores e líderes de equipe) - e Improdutivos - aqueles que participam do processo servindo como apoio quanto à venda, planejamento e controle dos serviços (gerentes de serviços, monitores de treinamento, consultores técnicos, etc.).
Ao pesquisar-se a área da oficina mecânica da concessionária de automóveis Mercury, verifica-se a existência de um sistema de indicadores que são utilizados para a tomada de decisão em nível local. Os principais indicadores utilizados são: i) Indicador de Aproveitamento (Aprov) = Tempo Gasto (TG) / Tempo Disponível (TD); ii) Indicador de Produtividade (Prod) = Tempo Padrão (TP) / Tempo Gasto (TG); iii) Indicador de Eficiência (Efic) = Tempo Padrão (TP) / Tempo Disponível (TD).
No caso da concessionária Saturn, os principais indicadores utilizados para medir o desempenho no processo produtivo estão relacionados aos colaboradores Produtivos - técnicos em serviços gerais - que são a produtividade, eficiência, aproveitamento e retrabalho. Os colaboradores considerados Improdutivos - que também são de fundamental importância para o desempenho do sistema - não possuem nenhum indicador para medir o seu desempenho, com exceção aos consultores técnicos que são medidos pelos seguintes indicadores: horas vendidas por ordem de serviço, taxa de agendamento e taxa de faltantes. Os indicadores de produtividade, eficiência e aproveitamento utilizados na Saturn possuem as mesmas fórmulas de cálculo já apresentados no caso da Mercury. O indicador taxa de agendamento pode ser calculado através da divisão do número de serviços agendados pelo número de serviços efetuados: Indicador Taxa de Agendamento = No. Serviços Agendados / No. Serviços Efetuados. Já o indicador taxa de faltantes pode ser calculado através da divisão do número de clientes que faltaram ao agendamento do serviço pelo número de serviços agendados: Indicador Taxa de Faltantes = No. de Clientes Faltantes / No. Serviços Agendados. E o indicador de retrabalho é calculado através da divisão do tempo gasto na execução de serviços que apresentaram defeitos e precisam ser refeitos pelo tempo disponível: Indicador Retrabalho = Tempo Gasto na Execução de Serviços com Defeitos / Tempo Disponível.
Ao pesquisarem-se as áreas da oficina mecânica das concessionárias Júpiter e Neptune, verifica-se que em ambas, também há um sistema de indicadores que mede o desempenho de seus colaboradores em nível local. Os principais indicadores utilizados por estas empresas para medir o desempenho no processo produtivo das oficinas mecânicas estão relacionados aos colaboradores Produtivos, que são a produtividade, eficiência, aproveitamento e retrabalho. Os colaboradores considerados Improdutivos - que também são de fundamental importância para o desempenho do sistema - não possuem nenhum indicador para medir o seu desempenho, com exceção aos consultores técnicos que são medidos pela quantidade de horas vendidas por ordem de serviço. Os indicadores de produtividade, eficiência, aproveitamento e retrabalho utilizados na Júpiter e na Neptune possuem as mesmas fórmulas de cálculo já apresentados nos casos da Mercury e Saturn.
6. Análise dos Casos
Diante dos atuais indicadores de desempenho utilizados nas áreas de oficina mecânica das concessionárias estudadas, pode-se fazer o seguinte questionamento: qual o comprometimento que o colaborador que trabalha na função de caixa (considerado Improdutivo) terá em atender o cliente o mais rápido possível, uma vez que não existe um indicador, por exemplo, número de notas fiscais impressas, que lhe pressione a executar tal atividade num menor tempo? Partindo da afirmação de Goldratt (1996) de que as pessoas agem conforme são medidas, este colaborador provavelmente não terá a mesma preocupação que o técnico automotivo teve para a execução do serviço, pois este possui indicadores que lhe pressionam a agir de determinada forma. Baseado no sistema de indicadores proposto pela Teoria das Restrições, pode-se afirmar que os indicadores utilizados nas oficinas mecânicas das concessionárias de automóveis estudadas medem apenas o impacto em nível local e não global do processo. Logo, os indicadores de produtividade, eficiência, aproveitamento, taxa de agendamento e taxa de faltantes não são bons indicadores para a avaliação do desempenho do processo produtivo como um todo, contribuindo para que os tomadores de decisão destas empresas realizem análises equivocadas e errôneas do desempenho dos colaboradores no processo. Em alguns casos um determinado colaborador pode estar com um desempenho em relação a estes indicadores superior aos demais. Porém, não significa que esteja gerando um maior ganho para a empresa. Nestes casos, o colaborador que está sendo mais lucrativo para a empresa é aquele que possui o pior desempenho em relação a estes indicadores.
O desempenho de um técnico automotivo – considerado Produtivo – entre os meses de março e abril de 2002 na concessionária Saturn em relação ao indicador de Aproveitamento é o seguinte: março/02 = 49% e abril/02 = 44%. Ao analisarem-se isoladamente estes resultados, pode-se afirmar que este colaborador teve um melhor resultado no período de março do que em abril de 2002. Porém o ganho obtido por este mesmo colaborador em abril/02 foi de R$ 19.989,00 enquanto que março/02 foi de R$ 12.884,00. Portanto, não significa que um percentual de aproveitamento superior a outro possa gerar efetivamente maior ganho para a empresa. O caso da concessionária Saturn serve de exemplo para a análise em torno do indicador de Produtividade, sendo que o mesmo colaborador citado apresentou em relação a este indicador os seguintes resultados: março/02 = 57% e abril/02 = 52%. Através da análise isolada pode-se afirmar que ele teve uma produtividade melhor no mês de março/02 do que em abril/02. No entanto, os resultados relativos ao ganho nestes dois períodos apontam que abril/02 foi melhor, reforçando a afirmação de que a análise isolada contribui para ações que podem levar a equívocos e erros prejudiciais para o sucesso do negócio.
Por exemplo, com relação ao indicador de Eficiência, pode-se afirmar que a mesma contradição ocorre desta vez na concessionária Júpiter. Um colaborador considerado Produtivo teve o seguinte desempenho em relação ao indicador Eficiência: fevereiro/02 = 84% e março/02 = 81%. Contudo, o ganho gerado por este colaborador nestes períodos foi de R$ 19.792,00 (fevereiro/02) e R$ 22.686,00 (março/02). Novamente, uma análise isolada não traduziria a verdade em torno de qual o desempenho proporcionou um melhor resultado para a empresa. Também se deve ter cuidado ao analisar-se o indicador Taxa de Agendamento de maneira isolada, pois se podem realizar análises equivocadas. Ou seja, não significa que uma taxa de agendamento superior a outra possa gerar maior ganho para a empresa. Porém, quanto maior for o percentual de agendamentos feitos, maior é também a capacidade de planejamento, controle e distribuição dos serviços na oficina mecânica da empresa. Atividades estas que contribuem para um melhor desempenho do processo como um todo, potencializando a capacidade de aumentar a geração de ganho.
O indicador Taxa de Faltantes permite identificar se as ações adotadas pelos consultores técnicos – considerados Improdutivos – estão sendo efetivas quanto ao comprometimento do cliente para com o agendamento do serviço. A análise isolada também levará a tomada de decisões equivocadas, pois este mede apenas o desempenho do consultor técnico. Quanto ao indicador de Retrabalho, pode-se verificar que este é o único – entre todos os indicadores levantados na pesquisa - que acaba avaliando o sistema produtivo de forma global, devido ao comprometimento que todos os colaboradores devem ter para atenderem as necessidades de seus clientes desde o início do processo – quando o cliente é recepcionado, normalmente por um(a) recepcionista – até a entrega de seu veículo consertado por um colaborador da concessionária – normalmente um manobrista. Toda vez que ocorre a necessidade de se refazer um serviço por motivos de qualidade, a empresa acaba ocupando capacidade, gerando despesas e deixando de aumentar seu ganho. Logo, este indicador deve ser continuamente minimizado para poder tornar a área de oficina mecânica competitiva em termos financeiros e também de imagem, pois toda vez que se precisa realizar algum tipo de retrabalho, a imagem da empresa começa a ser julgada pelos clientes.
Diante das análises feitas anteriormente, pode-se verificar que as oficinas mecânicas das concessionárias de automóveis pesquisadas necessitam do desenvolvimento de um sistema de indicadores que permita medir o desempenho global do processo e não apenas local, como ocorre atualmente. Além disto, este sistema de indicadores deve estar inter-relacionado com a meta da empresa. Neste sentido, o Sistema de Indicadores proposto pela Teoria das Restrições surge como uma alternativa viável de ser aplicada nas oficinas mecânicas das concessionárias de automóveis, agregando-se a este sistema o que Antunes Júnior (1998) chamou de indicadores locais. A Figura 1 apresenta um esquema de como pode ser desenvolvido o novo sistema de indicadores para as áreas de oficina mecânica das concessionárias baseado na TOC contendo um exemplo de indicador local (Taxa de Atendimento das Peças) desenvolvida pelos autores. A Taxa de Atendimento de Peças é um indicador local que mede o percentual de peças que são atendidas pela área de Materiais no momento da primeira solicitação por parte dos colaboradores considerados produtivos, sendo seu cálculo obtido: Taxa de Atendimento Peças = Número Peças Atendidas na Primeira Vez / Total Peças Solicitadas.
Para validar um indicador local neste Sistema de Indicadores da TOC, deve-se realizar o seguinte teste: o indicador deve ao mesmo tempo aumentar o Ganho, diminuir o Inventário e diminuir as Despesas Operacionais. Neste sentido, a Taxa de Atendimento das Peças pode ser considerada um indicador adequado à ser adotado pelas concessionárias de automóveis em suas áreas de oficina mecânica, pois quanto menor for a taxa de peças atendidas na primeira vez maior será o potencial de Ganho da empresa - vende-se imediatamente a peça - e tanto o Inventário (reduz-se o estoque) quanto as Despesas Operacionais (diminui-se o controle e a manutenção deste item) serão reduzidos.
7. Conclusão
Este artigo apresentou uma análise crítica em torno dos indicadores de desempenho utilizados atualmente nas áreas de oficina mecânica de 4 concessionárias de automóveis autorizadas gaúchas à luz da Teoria das Restrições. A pesquisa mostrou que estes indicadores são inapropriados para avaliarem o desempenho dos colaboradores envolvidos no processo produtivo das oficinas mecânicas, levando os tomadores de decisões destas organizações a realizarem, em muitas ocasiões, análises equivocadas do desempenho destes mesmos, diminuindo desta forma, o potencial de ganho da empresa.
Porém, deve-se ocorrer uma análise aprofundada de quais são as causas que levam estas concessionárias a utilizarem indicadores que não são adequados a uma melhor avaliação de desempenho de seus colaboradores no processo, além de não serem globais e integrados as metas da empresa. Uma das principais causas que contribuem para tal realidade nas oficinas mecânicas das concessionárias pesquisadas é que os indicadores utilizados – com exceção ao indicador de Retrabalho – são baseados na Contabilidade de Custos – CC. Esta possui como um de seus principais princípios, a otimização dos recursos localmente (sejam humanos, materiais ou máquinas), pois se acredita que ao aumentar a produtividade/eficiência de um recurso o processo como um todo estará sendo otimizado. Uma das principais conseqüências da utilização da CC é o grau de importância destinada as Despesas Operacionais, que neste caso são mais importantes que o Ganho e do que o Inventário, pois são mais tangíveis e fáceis de serem controladas. Com a adoção do Sistema de Indicadores da TOC, o indicador Ganho passa a ser mais importante, pois não tem qualquer limitação quanto ao seu aumento, ao contrário das Despesas Operacionais e do Inventário que dificilmente poderão ser reduzidos a zero. Assim, nos Sistemas de Indicadores baseados na CC, como são os das oficinas mecânicas das concessionárias de automóveis estudadas nesta pesquisa, não existe focalização. Já o Sistema de Indicadores proposto pela TOC, existe a necessidade de focalização nas restrições internas do sistema produtivo, que neste caso, poderão ser de dois tipos: a) os técnicos automotivos envolvidos no processo de conserto dos veículos e; b) as peças necessárias ao conserto dos veículos.
É importante destacar que esta pesquisa possui algumas limitações, pois foi construída com base em 4 estudos de caso, estando, portanto, sujeito a questionamentos quanto a sua generalização. Porém, as desconfianças quanto à veracidade da mesma são minimizadas, porque a pesquisa foi desenvolvida em empresas líderes de mercado em suas regiões e que possuem destaque no cenário nacional pelos resultados apresentados nos últimos anos. Além disto, esta pesquisa poderá servir de base para estudos futuros quanto à análise e desenvolvimento de indicadores não apenas nas áreas de oficina mecânica, mas também nas demais unidades de negócio que compõem as concessionárias de automóveis.
Referências
ANFAVEA. (2005) - Dados obtidos através do site da internet: www.anfavea.com.br
ANTUNES JÚNIOR, J. A. V. (1998) - Em Direção a Uma Teoria Geral do Processo na Administração da Produção: uma discussão sobre a possibilidade de unificação da Teoria das Restrições e da teoria que sustenta a construção dos sistemas de produção com estoque zero. Tese de Doutorado em Administração, Porto Alegre: Programa de Pós-graduação em Administração da Universidade Federal do Rio Grande do Sul/UFRGS.
GIANESI, I. G. N. e CORRÊA, H. L. (1996) - Administração estratégica de services: operações para a satisfação do cliente. São Paulo: Atlas.
GOLDRATT, E. M. e COX, J. (1994) - A Meta. Edição Ampliada. São Paulo: Educator.
GOLDRATT, E. M. (1996) - A Síndrome do Palheiro: Garimpando Informação num Oceano de Dados. Edição Ampliada. São Paulo: Educator.
LEIS, R. P. (2002) - Método de Melhoria para Processos Produtivos de Oficinas Mecânicas de Concessionárias de Automóveis Brasileiras – uma abordagem a partir da Produção Enxuta/ Sistema Toyota de Produção e da Teoria das Restrições. Dissertação de Mestrado em Administração, São Leopoldo: Programa de Pós-graduação em Administração da Universidade do Vale do Rio dos Sinos/UNISINOS.
MACKE, J. (1999) - Desenvolvimento de Um Modelo de Intervenção baseado no Sistema Toyota de Produção e da Teoria das Restrições: a utilização da Pesquisa-ação em uma Indústria de Cerâmica de Pequeno Porte da Região Metropolitana de Porto Alegre. Dissertação de Mestrado, Porto Alegre: Programa de Pós-graduação em Engenharia de Produção da Universidade Federal do Rio Grande do Sul/UFRGS.
PPGA/UFRGS. (2005) - Dados obtidos através do site da internet: www.ppga/ufrgs.com.br
RIBEIRO, H. P. (2000) - Uma Estratégia Competitiva para Uma Revenda Autorizada de Veículos. Dissertação de Mestrado em Administração, Porto Alegre: Programa de Pós-graduação em Administração para Executivos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul/UFRGS.
RODRIGUES, L. H. (1990) - Análise da Tecnologia da Produção Otimizada (OPT) e da Teoria das Restrições (TOC). Anais do XIV Encontro Anual da Associação dos Programas de Pós-Graduação em Administração/ENANPAD. Florianópolis.
YIN, R. K. (2001) - Estudo de Caso: planejamento e métodos. 2. ed. Porto Alegre: Bookman.